terça-feira, 2 de junho de 2015

LIVRO - Náufrago da aurora




LANÇAMENTO 


"Náufrago da aurora" é meu primeiro livro lançado, em que trago poemas feitos entre os anos de 2009 e 2012.  O poema a seguir, "Apanhadores de estrelas", é um dos que fazem parte do livro.









A gente brinca com o Sol que não existe.
Uma estrela de talvez e querer que carregamos desde pequenos,
como uma bola, boneca
ou amigo imaginário.

De um nada multicor, enxergamos a luz espalhar-se em coloridos nossos.

São cores que voam, perdidas, pela infância,
e nos acompanham, até quando o fôlego dos pincéis de sonhos secam.

E continuamos a brincar, mesmo havendo apenas cinza

pois, mesmo mortas, as estrelas iluminam o infinito
sem nos dizer de seu silêncio.

domingo, 21 de dezembro de 2014

Solar


Plantamos discretos sóis
Nos secos vastos de descrenças.

Descalços de distâncias, descremos
de trilhas e de errâncias,

pisando no infinito que nos funda.
E flores fincam cores no cinza insosso:

sombreiam amarelos de leves sons –
sussurros de olhos que cantam auroras.








*Desenho de Juliana Lesquives, para quem dedico este poema.

domingo, 16 de novembro de 2014

Déjà vu


Me canso e morro de distâncias não ditas.
Os pés ardem do peso do pó
de uma encruzilhada à frente
e racham-se, temendo a secura.

Ponderando imponderáveis,
calço meus calos do medo desvisto,
desenhado por miragens passadas de trilhas e perdas.

E permaneço.
Morto.
Assassinado pela sede não sentida -

enquanto águas me contornam,
margens brilhantes de cegueira e vida:

os pés, hidrófobos, afundam-se pedras,
(des)esperando a dor futura.

domingo, 28 de setembro de 2014

Via Láctea


Não vi a noite naquele universo
quente, de claro afeto e calma.

Um som rasgava minhas órbitas
mortas há milênios-luz,
e um sol tonteava astros em mim.

Afundava-me no Branco,
pulsante, como o primeiro fogo –
o verbo que, de sua boca,
brotava a aurora do universo.

Eu desvia a vida em que afundava,
secando-me de vácuo e frio:

quando mudo me quis Lua,
explodi, supernova.

E da luz aberta,
num Todo-horizonte,
era eu clareira,
caminho,
você.

domingo, 21 de setembro de 2014

Apneia


Mergulho, afundando o fôlego
na calma azul do dia, de marolas e suspiros.
O ar percorre o corpo – sabido do fim –
inundando de mar as veias.

Os braços soltam-se, abertos,
percorridos de desejos molhados,
e um sol educado põe-se,
tingindo laranjas no mar incandescente.

Os olhos fecham-se, serenos,
despindo sinestesias.

– Dispo-me da superfície insossa e seca –

E, a fundo, ignoro o ar que finda,
feito de futuros e securas.
As águas que me respiram carregam
o gosto de sol, sal – seu –
na noite navegada de universo.

– Pulmões extasiam-se num gemer abissal –

No mar em que amanheço,
ecoo marulhos, acordado de distâncias:

respiro gotas, infinitas, de um
atlântico vermelho, pulsante.

Auroras irrigam valsas
de meu vasto e rochedo peito.

sábado, 20 de setembro de 2014

Abissal de Narciso


A última gota esvai-se no espelho.
Borrada, escorrida de incertezas,
trança frestas sentidas.

Há silêncios trincados – veias expostas
de um moribundo sorrir, sonhar.

O dilúvio em cacos,
mar de eus náufragos:

ilhados na areia ferina e fervente,
evaporando o traço rascunho –
antes falésia dos olhos altos,
mirados ao céu, apoiados em águas.

                           .   .   .

Os cascalhos chacoalham ecos,
seixos de si, saudosos,
sedimentos sentimentos:

um rosto apagado,
alagado de pó,
vento
e nada.






quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Aquário de náufragos



Há um lago de tormentas represadas,
de um claro-calmo falso,
margeando o incabível.

Um dia infinito - marítimo querer -,
o espelho d'água parte-se
em abissais,

e o mergulho,
derramar-se da alma,
agora afunda, sufocante,
a íris que grita
o reflexo.

O oceano que se desfaz,
espirrando o lago,
é eco de longo anseio
de um frágil nadar,

despido de face, fé
de fôlego -

de fim.